Será economicamente viável de extrair metais nos fundos dos oceanos? A extração de metais no alto mar tem recebido muita atenção da parte dos médias, das organizações ambientais e de várias indústrias nos últimos anos. A razão é simples: os proponentes da extração em alto mar apresentam esse tipo de extração como necessário para a transição energética dos próximos anos. Como os governos e as empresas eletrificam cada vez mais setores e serviços, precisamos cada vez mais de metais como o cobalto, o níquel, o cobre e o manganês. Mas será verdade? Extrair o fundo dos oceanos é mesmo necessário para seguir a demanda? E a que preço?

Em 2023, escrevi um artigo sobre as polémicas à volta da extração de minerais em alto mar, nomeadamente a guerra entre os ativistas para o ambiente e os defensores desse tipo de extração. Se a organização internacional que controla as extrações nos oceanos (ISA) ainda está a debater se deve ou não dar autorização à extração de minerais nas profundezas dos mares internacionais, alguns países como a Noruega e o Japão promovem essa prática nos seus mares nacionais.
Consequentemente, as conversas sobre os benefícios e os custos para o planeta da extração de minerais em alto mar podem tornar-se intensas. No entanto, a questão da sua viabilidade económica é raramente relevada nessas conversas. The Planet Tracker, um grupo de reflexão sobre finanças sustentáveis sem fins lucrativos, publicou dois relatórios sobre essa questão em Novembro do ano passado e um guia político em Janeiro.
Mas antes de explorar as questões financeiras ligadas à extração de minerais em alto mar, é fundamental perceber porquê os defensores dessa prática pensam que é necessária para um futuro sem emissões de gases de efeito de estufa. Por enquanto, os minerais usados para as baterias e outras tecnologias verdes são extraídos na terra. Mas segundo a agência internacional de energia (IEA), a demanda para estes minerais vai aumentar consideravelmente com a aceleração da transição energética. Num relatório publicado em Maio 2021, a IEA declara que “o abastecimento desses minerais é essencial para as tecnologias verdes como os veículos elétricos e as turbinas das eólicas. E a transição tem que avançar rapidamente nas próximas décadas para atingir as metas mundiais. Portanto, o abastecimento desses minerais pode criar riscos em termos de segurança energética e os governos têm de agir agora para tratar e evitar esses riscos.” Ou seja, para atingir as metas fixadas pelos acordos de Paris, a IEA estima que será preciso quadruplar a quantidade de minerais necessária para as energias verdes daqui 2040. Mas para atingir globalmente zero emissões em 2050, será preciso seis vezes mais minerais daqui 2040.

Mas quais são os riscos identificados pela IEA?
Para a IEA, há vários fatores que podem criar riscos com o aumento da demanda global destes minerais. Um dos mais importantes vem do fato que a qualidade dos minerais está a diminuir. “Nos últimos anos, a qualidade dos minerais usados para bens diversos tem diminuindo constantemente. Por exemplo, a qualidade do cobre que vem do Chile diminuiu de 30% nos últimos 15 anos. Extrair metais dos minerais de baixa qualidade necessita mais energia, põe pressão nos custos de produção, aumenta as emissões de gases de efeito de estufa e o volume de lixo”, explica a IEA no seu relatório.
Além disso, os consumidores e os investidores estão cada vez mais vigilantes no que toca ao impacto ambiental e social destes minerais. A extração e o processo dos minerais impactam o ambiente e as comunidades locais, o que também causa distúrbios no abastecimento. Portanto, os consumidores e os investidores pedem cada vez mais às empresas para usar metais sustentáveis e responsáveis. Para a IEA, esses dois fatores (e outros) demostram que o abastecimento atual dos minerais e os planos de investimento ainda estão longe do ideal para transformar o setor da energia e conseguir acompanhar a demanda.
Em geral, empresas como The Metals Company no Canadá usam esses dois fatores para promover a extração mineira no alto mar. Para essas empresas, “os oceanos estão mais ameaçados pelas mudanças climáticas do que pela extração mineira”. Além disso, um estudo sugere que a extração nas profundezas dos oceanos é menos perigosa que a extração na terra porque “a primeira opção pode talvez reduzir os impactos ambientais de 70-80% em comparação à segunda”.
Se a questão de saber se a extração de minerais é segura ou não para o ecossistema do oceano é debatida, vou pôr-la de lado para poder examinar os relatórios do The Planet Tracker sobre a questão económica desta prática. A ISA estima que existe entre 480 milhões e 13’500 milhões de toneladas de nódulos polimetálicos. Esses nódulos contêm vários minerais como o níquel, o cobalto, o cobre e o manganês. Mesmo se há nódulos por toda a parte dos oceanos e até nos lagos, os que têm um interesse económico estão mais localizados. Segundo a ISA, esses nódulos são mais abundantes na zona de Clarion-Clipperton perto da costa oeste do México no oceano Pacífico, na Bacia central do oceano Indiano e na Bacia do Peru.

Ao olhar para estas estimações, o potencial económico da extração mineira nos oceanos parece imenso. Mas esta prática também tem vários desafios. Um dos relatórios explica que “se os metais extraídos no mar entrassem no mercado, os preços globais do cobre, do cobalto, do níquel ou do manganês poderiam baixar”. Estes metais rendem, em média, mais de 560 milhares de dólares (americanos) em exportações por ano para os 12 países mais dependentes da extração destes metais. Por exemplo, 34,2% do PIB anual da República Democrática do Congo (RDC) vem destas exportações, e, para a Zâmbia, chegam a 37,5% do seu PIB. Para os autores do relatório, “até uma diminuição mínima do preço destes minerais tem o potencial de criar uma redução significante nas receitas dos Estados e de criar outros problemas económicos e sociais como a aumentação da taxa do desemprego e uma receção”.
Além disso em 2023, cinco destes doze países foram categorizados pelo Banco Mundial como países de “rendimento médio baixo” (Congo, Geórgia, Mongólia, Papua-Nova Guiné e Zâmbia) e um (RDC) como país de “rendimento baixo”. Consequentemente, estes países não estão preparados para lidar com as consequências de uma diminuição do preço dos minerais.
Mas será que a extração no alto mar pode ser benéfica para outros países?
Segundo a Convenção das Nações Unidas sobre a Lei do Mar (UNCLOS), as empresas só podem candidatar-se para extrair nas águas internacionais se forem patrocinadas por um Estado. E devido aos acordos destes patrocínios, as empresas podem ter de pagar um imposto sobre as suas receitas. Um dos relatórios do The Planet Tracker calcula que os países patrocinadores poderiam receber até 6,25 milhões de dólares por ano; um montante que os autores do relatório consideram como “uma contribuição insignificante nas receitas dos Estados”. Mas os Estados patrocinadores também podem não receber nada por causa de acordos existentes entre patrocinadores e empresas onde as empresas são isentas de impostos.
Por outro lado, as extrações mineiras no alto mar podem não render muito às empresas, segundo o relatório. “Atualmente as empresas que extraem minerais em zonas internacionais têm de pagar à ISA um certo montante sobre os rendimentos; um montante que é distribuído pela ISA aos Estados membros. A ISA tem de criar regras para partilhar os benefícios económicos das extrações mineiras no alto mar de forma justa”, declara a convenção da ISA.
Para a IEA, os impactos financeiros, técnicos e ambientais criados pela extração no alto mar não podem ser ignorados.
Os autores do relatório estimam que cada Estado membro da ISA é capaz de receber entre 42’000 e 1,1 milhão de dólares por ano graças à extração de minerais: “uma contribuição insignificante para os tesouros dos governos” segundo os especialistas. A ISA pode receber até 270 milhões de dólares por ano mas é capaz de deduzir 80 milhões em custos administrativos e em ajudas para os países afetados pela extração no alto mar. “Além disso, a ISA tem o direito de fazer deduções ilimitadas antes da distribuição aos membros, o que pode reduzir significativamente o montante recebido pelos Estados”, acrescentam os autores.
Voltando à minha pergunta inicial, será que a extração de minerais no alto mar é uma solução viável economicamente?
Mesmo se a extração na terra apresenta vários desafios, a extração no alto mar só agrava os problemas existentes a nível económico e ambiental. Para a IEA, os impactos financeiros, técnicos e ambientais criados pela extração no alto mar não podem ser ignorados. No seu relatório de 2021, a agência sublinha o fato que “as tecnologias necessárias para a extração de minerais na terra ou a extração de gás ou petróleo no mar são diferentes das tecnologias necessárias para a extração de minerais no alto mar. As máquinas e os veículos de coleção dos minerais têm de ser comandados à distância e funcionar em zonas de alta pressão. E as competências para extrair metais também são diferentes. Se um projeto piloto funcionou no Japão em 2017, ainda é preciso desenvolver essa tecnologia para fazer com que esse processo seja comercializado.”
Na minha opinião, as indústrias e os governos têm de tentar resolver os problemas atuais em vez de criar mais problemas. Algumas das soluções apresentadas pela IEA incluem: a reciclagem dos minerais, a redução da intensidade material, o incentivo para a substituição dos materiais e a consolidação das colaborações internacionais entre os produtores e os consumidores.
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