Segundo a UNICEF, 129 milhões de raparigas no mundo não vão à escola. As razões para esta situação variam de país para país, porém há uma conclusão que os estudos têm demonstrado consistentemente: quando as mulheres têm uma educação, os países beneficiam da situação. Como afirma a fundadora de 18twenty8 Refiloe Seseane: "como mulheres, não podemos continuar a ser postas à margem como se não existíssemos ou como se não tivéssemos valor porque temos mais valor do que pensamos".
"Quando tinha 28 anos, decidi ser a irmã mais velha que nunca tive e ajudar outra menina de 18 anos. Pensei comigo mesma: quero ter pelo menos uma jovem que eu possa ajudar a concluir a universidade, ter suas mensalidades pagas e dar-lhe uma direção" conta Refiloe Seseane ao relembrar como 18twenty8 – sua organização que ajuda mulheres entre os 18 e 28 anos na África do Sul para obter um ensino superior – surgiu.
Em 2008, Refiloe deixou o emprego como analista de investimentos num banco privado em Cape Town e voltou para sua cidade natal, Joanesburgo. "Eu acordava todos os dias e pensava: a vida tem que ser mais do que isso! O que estou a fazer aqui?" Naquela época, ela começou a pensar no período de dez anos (18 a 28 anos) de luta para entrar na Universidade e acabar o curso. A dificuldade veio por questões financeiras, mas também porque ela estava perdida e não sabia que curso seguir. "Há momentos em que as coisas acontecem e prejudicam a tua confiança e autoestima. Nessas horas, ter alguém que está lá para te apoiar é muito importante" conta ela com muita emoção na voz.
No início, ela tornou-se a mentora de algumas raparigas, mas rapidamente, o que começou como uma simples mentoria, tornou-se numa organização em 2011. O nome da organização, 18twenty8, não se refere apenas à experiência pessoal de Refiloe Seseane, mas também à idade das suas beneficiárias. Para a fundadora, esse período de dez anos é crítico na vida de uma jovem porque ela toma muitas decisões acadêmicas e pessoais.
A associação tem quatro programas principais, um dirigido a raparigas do 11.º e 12.º ano (nomeadamente workshops sobre competências para a vida) e três para estudantes universitários. Os workshops acontecem nas escolas das comunidades desfavorecidas em áreas marginalizadas. Os membros da organização falam com raparigas nos últimos anos do ensino médio sobre a importância do ensino superior para se sentirem capazes e independentes, ajudam-nas a iniciar candidaturas às universidades, expõem-nas a diversos planos de carreira e abordam outros assuntos, como violência baseada no género e problemas ambientais.
"Essas meninas geralmente vêm de famílias onde faltam modelos acadêmicos ou mentores. Normalmente são as primeiras da família a terminar o ensino médio e portanto nem sempre pensam em começar estudos na universidade", destaca a fundadora. Embora o foco principal da organização seja o ensino superior, a Refiloe também quer capacitar as mulheres jovens em geral.
Por exemplo, Salie Molefe, uma estudante da International Hotel School e uma das beneficiárias da 18twenty8, foi criada por uma mãe solteira que tem vários empregos para cuidar dos filhos. "Faço parte das muitas raparigas sul-africanas que vivem em casas com mães solteiras e que não são suficientemente grandes para a quantidade de pessoas que realmente vivem nestas casas. Venho de um município onde as meninas engravidam aos 13 anos, são abusadas pelos homens que consideram como tios e abusam de substâncias e álcool aos 12 anos. Muitas vezes, elas abandonam a escola porque precisam de cuidar dos filhos. Aos 20 anos, a maioria delas já têm quatro filhos, estão sem emprego, sem marido, sem educação e sem futuro" descreve.
Para Salie, a oportunidade que a organização lhe deu é uma bênção porque ela sabe quão prevalente é a violência contra mulheres e crianças na África do Sul. "É assustador porque nada acontece para manter essas mulheres e crianças seguras. Estamos sempre a pensar: será que sou a próxima? Graças à 18twenty8, o meu futuro parece mais claro. A organização deu-me uma oportunidade pela qual muitas pessoas rezam todas as noites", acrescenta ela.
"Damos-lhes ferramentas práticas para lidar com questões relacionadas com a violência de género, tais como aulas de autodefesa, ou ensinamos-lhes onde ir para obter ajuda quando enfrentam esses problemas. Também falamos do ambiente para que as raparigas possam começar a pensar na terra como uma amiga e um lugar a preservar e respeitar. Fazemos coleta de lixo na escola, falamos de reciclagem e convidamos pessoas que têm um trabalho ligado as questões ambientais para partilhar seus conhecimentos. Também as expomos a diversas carreiras durante os workshops de desenvolvimento profissional onde profissionais de diversos setores vêm e explicam o tipo de trabalho que fazem" detalha Refiloe.
Para a fundadora, o aspeto mais importante deste programa é garantir que, quando acaba, a organização tenha instalado na cabeça das raparigas o sentimento que são capaz e que as raparigas mais velhas na escola comecem a influenciar as mais novas.
Os outros três programas oferecidos pela 18twenty8 concentram-se nas estudantes das universidades através do programa de assistência financeira, da rede de irmãs mais velhas e do campo de liderança.
O ensino superior é caro em muitas partes do mundo, incluindo a África do Sul. O papel da organização é encontrar um número de doadores – principalmente na África do Sul, no Reino Unido e nos EUA – para obter fundos e pagar todas as propinas e custos das estudantes associados à obtenção do seu diploma e, assim, aliviá-las das suas preocupações relativas às finanças.
"Há raparigas que são muito competentes academicamente mas, devido a restrições financeiras, têm dificuldade ou não conseguem terminar o curso. Há também raparigas que entraram na universidade, mas os custos são tão elevados que não conseguem ter um bom desempenho porque têm de se concentrar em ganhar dinheiro em vez de estudar. E outras que contraem empréstimos para pagar os estudos, mas depois de se formarem, o seu histórico crédito as impede de conseguir o emprego para o qual estudaram" explica Refiloe Seseane.
É o caso de Snqobile Gumbi, estudante da Universidade da África do Sul. A organização entrou em contato com ela quando ela começou o primeiro ano. "Precisava do saldo das minhas taxas para puder continuar os meus estudos e começar os módulos do segundo semestre. E lembro-me de me ter perguntado: o que eu estava a pensar quando decidi inscrever-me para estudar sem ajuda financeira? Tive mesmo muita sorte", conta ela.
Além da ajuda financeira que as alunas recebem, a rede irmã mais velha lhes dá apoio social por meio de orientação. A organização combina as jovens com alguém que regularmente arranja tempo para ligar, encontrar-se ou enviar mensagens para saber como estão. A irmã mais velha geralmente é uma mulher que trabalha na carreira que as estudantes desejam seguir. Esta especificidade que diferencia a 18twenty8 de outras organizações de bolsas foi inesperada para o Snqobile. "Eu não sabia o que esperar deles e fiquei realmente emocionada com a forma como eles me apoiam, especialmente através da minha mentora. A organização mostrou-me que existem pessoas generosas e genuinamente dispostas a ajudar a realizar o sonho de outra pessoa" explica.
O terceiro programa oferecido pela organização é o acampamento de liderança e tem como objetivo reunir raparigas de diferentes universidades da África do Sul. Durante esse fim-de-semana, o objetivo da 18twenty8 é desbloquear o potencial de liderança das jovens e ajudá-las a ver que têm o arbítrio para resolver quaisquer problemas que enfrentam.
"Muitas vezes estas jovens sentem que não nasceram líderes e, portanto, pensam que não lhes pertence falar sobre o que querem. O campo de liderança é um lugar onde elas são obrigadas a falar e abordar os problemas que enfrentam. No fim do campo, formam-se muitas amizades e as jovens saem daqui a perceber que quaisquer que sejam os problemas que enfrentem, não são as únicas a viver esta situação, alguém está a passar ou já passou por algo semelhante", acrescenta a fundadora.
"Eu definiria a organização como uma grande irmandade. É muito bom saber que posso conversar com a Refiloe ou com qualquer pessoa da organização sobre qualquer coisa além das necessidades acadêmicas", expressa Minenhle Mthembu, estudante da Universidade de Pretória. Embora ela tenha sido beneficiária de outras bolsas no passado, sua experiência com a 18twenty8 é muito diferente. "Sinto que não sou apenas uma beneficiária ou mais uma menina que precisa de ajuda, mas um ser humano. No futuro, adoraria ser também uma patrocinadora e ajudar outras raparigas porque gostaria de ver mais mulheres receberem as mesmas oportunidades que eu estou a receber", continua ela.
Para Refiloe Seseane, o ensino superior das mulheres não é apenas importante porque eleva as mulheres, mas também é necessário para abordar questões sistémicas que vêm do patriarcado na África do Sul. De acordo com o departamento de estatísticas da África do Sul, 42,1% de todos os agregados familiares eram chefiados por mulheres em 2021, e os agregados familiares chefiados por mulheres eram mais comuns nas zonas rurais (47,7%).
"O que acontece quando uma mulher tem de passar mais tempo no trabalho porque tem de pôr comida na mesa e sustentar os filhos é que algumas áreas acabam por ser negligenciadas, nomeadamente no que toca a instalar a importância da educação nas mentes das crianças. E o que sabemos é que, se uma mulher for mais qualificada, ela tem mais probabilidade de ter um emprego com melhor remuneração. Ouvimos histórias de que a maioria dos milionários abandonou a universidade, mas essas pessoas são atípicas. A maioria das pessoas precisam do apoio de um diploma universitário para poder conseguir um determinado nível de emprego. E as mulheres com melhor formação tomam melhores decisões em termos do seu planeamento financeiro, da sua própria saúde, especialmente da saúde reprodutiva e mental, mas também da família em geral, o que é vital para o bom funcionamento de uma sociedade. Certamente não teríamos tido tanto interesse na nossa organização se não houvesse uma grande necessidade", explica a fundadora.
Embora a organização já esteja a impactar a vida de muitas jovens, a Refiloe Seseane aspira fazer da 18twenty8 uma organização nacional. Por enquanto, o seu trabalho centra-se principalmente na província de Gauteng, especificamente em Joanesburgo. Ela também incentiva mulheres e homens na África do Sul a unirem-se com um sentido de propósito e direção. "Como mulheres, não podemos continuar a ser postas de lado, como se não existíssemos ou como se não tivéssemos valor, porque temos mais valor do que pensamos", conclui.
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