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Foto do escritorAndreia

A Barbie é feminista e está tudo bem

Ultimamente só vejo rosa à minha volta: desde o marketing agressivo da Barbie até a discussão online após o lançamento do filme em 21 de Julho. Um dos principais debates sobre o filme da Barbie é saber se a icônica boneca é feminista ou não. Sendo eu mesma uma feminista e tendo assistido ao filme, tenho a minha opinião. (Atenção, há alguns spoilers!)


Desde abril de 2022, quando a primeira foto da atriz Margot Robbie como Barbie foi revelada, o mundo inteiro só fala da Barbie, especialmente online. E as discussões, principalmente sobre o feminismo, têm aumentado ainda mais desde o lançamento do filme. Uma das razões pelas quais as pessoas falam tanto sobre feminismo é por causa da intenção explícita do filme de ser um filme feminista. Não só Greta Gerwig, a diretora do filme, afirmou em inúmeras entrevistas que "é com certeza um filme feminista", no filme, a palavra também é explicitamente usada várias vezes e a Barbie é considerada uma figura feminista.


Mas a Barbie é realmente feminista?


Por mais que tenha gostado de assistir ao filme com suas piadas e ironia sobre o patriarcado da nossa sociedade, não acho que seja feminista. É engraçado ver o quanto absurdo é o sexismo através de Ken quando ele descobre o patriarcado e implementa-o na Barbieland (país da Barbie) que se torna Kendom (reino do Ken). Mas esse tipo de feminismo, às vezes chamado de "feminismo branco", não é suficiente. Precisamos de mais e não podemos esperar isso de um filme.


Uma referência a "2001: uma odisséia no espaço". Foto: Warner Bros.

O primeiro problema que tenho com o filme é o uso da Barbie como uma figura feminista. A primeira cena é uma referência a "2001: uma odisseia no espaço" de Stanley Kubrick e o objetivo é de mostrar a Barbie como uma revolução humana. Embora essa cena possa ser interpretada como irônica, o resto do filme tenta sempre posicionar a boneca como feminista. Então, será que a cena é realmente irônica ou a Mattel, a empresa que produz a Barbie, quer manter-se relevante para continuar a vender produtos?


Isso é também visível na forma como o filme apresenta a Mattel. A empresa é criticada pela falta de mulheres como líderes na sociedade, mas não é por apontar para esses problemas que as mudanças vão acontecer.


O que vejo é um filme que reconhece o sexismo num nível muito superficial. O filme não aborda os lados mais sombrios do sexismo, como a violência doméstica, e também elimina completamente a interseccionalidade com outras formas de discriminação, como racismo, capacitismo ou classismo.


E isso leva-me ao segundo problema que tenho com o filme: ignora completamente o capitalismo. E por isso, o feminismo branco é muito bem aceito (e usado) pelas empresas. Esse tipo de feminismo não desafia os sistemas existentes. Não questiona a conexão entre sexismo e racismo, capacitismo ou classismo. O foco principal desse feminismo é de fazer com que todas as mulheres tenham os mesmos direitos e oportunidades, especialmente no mundo do trabalho para alimentar a máquina capitalista. Isso desconsidera completamente o que as mulheres desejam, porque pressupõe que todas as mulheres desejam a mesma coisa. Também ignora os desafios enfrentados pelas mulheres em todo o mundo, considerando que as mulheres só precisam de emancipação nas suas carreiras.


"Pode fazer o que quiser, tem o direito de fazer o que quiser" Mattel parece dizer com este filme. Mas, na minha opinião, o capitalismo e o feminismo são opostos.

O filme só trata de certas questões com mais profundidade quando Sasha (interpretada por Ariana Greenblatt), uma adolescente que tem uma relação difícil com a mãe, conhece a Barbie no mundo real. Sasha confronta a boneca com todos os problemas que ela criou por sua própria existência. Por exemplo, ela fala sobre os padrões de beleza inatingíveis que a Barbie criou nas mentes das meninas, uma das maiores críticas que a Mattel enfrentou ao longo dos anos. "Criaste complexos nas mulheres desde que foste inventada", diz ela a Barbie. E de fato, ao longo dos anos a Mattel foi marcada por vários escândalos como em 1965 quando a empresa criou um Kit Barbie para festa do pijama. Esse kit continha uma balança com a agulha nos 50kg e um livro com a pergunta "como perder peso" na frente e a resposta "não comas" nas costas.


Sasha também aponta o fato de que a Barbie "mata o planeta com [sua] glorificação do consumismo". Esse é mais um problema que tenho com o filme porque não reconhece a ligação entre as questões ambientais e o sexismo.

A Barbie é uma boneca de plástico e a Mattel é totalmente responsável não apenas por abusar dos direitos dos trabalhadores nas suas fábricas, mas também por explorar recursos para sua produção e criar mais poluição plástica no mundo.


Sem surpresa, o filme nunca volta às questões levantadas por Sasha. E como Sasha representa uma adolescente revoltada que odeia o mundo inteiro, o filme não a leva a sério. Na minha opinião, essa cena é uma forma para Mattel de reunir o maior número possível de pessoas em frente ao filme e dar as pessoas da "geração z woke" uma personagem com quem elas possam se identificar.


A verdadeira maestria deste filme não é de falar de feminismo num blockbuster mas sim de direcionar o discurso sobre o filme de uma forma conveniente para a empresa. Ao usar a Barbie como uma figura feminista, a Mattel dirige a atenção para a boneca e não para as mudanças que precisam de acontecer no nosso mundo. Para a Mattel, a independência da mulher encontra-se no consumo, na participação do sistema que se alimenta das desigualdades e discriminações.

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